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quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

E (quase) tudo os hipers, os “shoppings” e os outros “tais” levaram …

 
Os discursos e as notícias sobre a recessão económica, sobre a austeridade e os seus efeitos, sobre a espiral de empobrecimento e retrocesso ao nível dos vectores de desenvolvimento estão na ordem do dia.
Apesar disso, talvez não seja assim tão frequente conseguirmos encontrar reflexões, quer a nível de imprensa, quer a nível dos diálogos de “rua”, sobre as verdadeiras causas, e as causas mais profundas, que contribuíram e contribuem em larga medida para esse cenário de dita “crise”.
Um dos aspectos que estará, porventura, mais subestimado e que raramente é tido em consideração, levando em linha de conta por exemplo as suas repercussões económicas, prende-se com o processo de brutal “desaparecimento” dos modelos de Comércio Familiar e de Pequena/Média Escala - CFPME. O comércio tradicional tem vindo a caminhar a passos largos para uma situação de quase extinção. Considere-se por exemplo os seguintes dados: “O primeiro hipermercado em Portugal surgiu a 10 de Dezembro de 1985. Ao longo das duas décadas e meia que entretanto passaram, abriram mais 74 unidades, o comércio tradicional perdeu mais de 70% da sua importância e fecharam cerca de 24 mil lojas.”(1)
Ou seja, considerando a velocidade e a escala de encerramento de pequenas lojas, podemos dizer que qualquer dia já não restam lojas de comércio tradicional (Segundo a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), ainda com base em dados da AC Nielsen, havia pouco mais de 18 mil lojas de comércio em Portugal em 2009 e em 1985 existiam mais de 42 mil.)” (2), caso algo de muito determinado e efectivo não seja feito no sentido de inverter o fenómeno. E a realidade é que pouco, ou em muitos casos nada, está a ser feito para travar esse processo.
Por outro lado é fundamental salientar que existem inúmeras dimensões e aspectos que não são passíveis de conter na dimensão meramente estatística da questão.
É fundamental considerarmos que o comércio é uma actividade praticamente intrínseca e paralela à própria evolução da história da humanidade. O comércio - e essencialmente estamos-nos a referir a um Comércio Familiar e de Pequena/Média Escala (aquele que predominou, para não dizermos que seria até então o único modelo existente, na história da humanidade nos últimos séculos) - foi e é uma actividade crucial para a vitalidade económica e por inerência social das comunidades locais.
Inicialmente os “burgos” eram naturalmente os locais onde se desenvolvia o grosso da actividade comercial e deram origem a uma classe social designada de "burguesia", (o que representou de certa forma uma ruptura com os modelos tradicionais cingidos a uma lógica feudal que dividia as classes entre nobreza – ou os que “exploravam” – e o povo – os que eram, e de que maneira, “explorados”. Entrando na equação também o “clero” que, em larga medida, constituía uma terceira classe que pertencia mais à primeira ordem – os que exploravam, ainda que com outras nuances – do que certamente à segunda – os que eram “explorados”.).
Estamos a falar sobretudo de um comércio essencialmente de bens de primeira necessidade (alimentos – pão, frutos, legumes, etc. – madeiras, etc.) mas também de bens produzidos pelos diferentes ofícios existentes então (ferreiros, sapateiros, pelames, etc.). Pode-se afirmar que era um comércio predominantemente “directo”, em que o produtor, ou artífice, vendia directamente ao “consumidor”. Era portanto uma realidade em que a existência de intermediários, ou o que hoje chamaríamos de retalhistas, era ainda algo marginal. As coisas foram-se modificando ao longo da história, nomeadamente com o surgimento da já mencionada classe mercadora, a “burguesia”, mas começaram a modificar-se ainda mais acentuadamente na Revolução Industrial. Ainda assim, e recorrendo à própria história da cidade do Porto, podemos afirmar que a produção “em massa" ou “em série” – que acabou em muitos casos por ser o princípio do fim de vários desses ofícios tradicionais e artesanais – não alterou radicalmente, contudo, o modelo de produção/consumo. Ou seja, houve um incremento da actividade comercial em termos do aparecimento de novos modelos de comercialização, começaram a surgir mais lojas um pouco em contraponto ao modelo tradicional de produção e venda directamente nas próprias “oficinas”, ou através de feiras e mercados mais ou menos “oficiais”, mas essas lojas mantinham um carácter essencialmente local (não obstante algumas delas efectuaram vendas um pouco para todo o país e por vezes até para outros países), familiar e algo que se poderá hoje em dia classificar de … tradicional. Ou seja, estamos a falar de estabelecimentos que, regra geral, eram propriedade de uma única pessoa, ou de uma família. E que comercializavam essencialmente no local, “sobretudo na cidade” onde estavam, sendo minoritárias as situações de estabelecimentos com sucursais e delegações a nível nacional ou sequer regional (o que significa que estamos a falar de um comércio com um forte vínculo à comunidade local). E estamos a falar de um comércio principalmente especializado numa determinada área, num determinado sector.
Obviamente que as transformações mais acentuadas deste género de estrutura de comércio aconteceram nos ditos países industrializados sobretudo após a II Grande Guerra Mundial. Em Portugal aconteceu sobretudo a partir da década de 80, muito em particular com a adesão (com tudo o que isso implicou a vários níveis) à Comunidade Económica Europeia – C.E.E.
O comércio - e num período de tempo que podemos considerar, do ponto de vista histórico, bastante curto - deixou de ser de uma matriz essencialmente local, familiar e de relativamente “pequena escala” para passar a ser de uma matriz essencialmente globalizada, corporativa e de grande escala (o que não significa que, muitas vezes, apesar de nos estarmos a referir a grupos de retalho gigantescos, a maior parte do capital gerado não acabe por reverter para um grupo muito restrito de indivíduos bilionários).
Existem portanto diversos aspectos que permitem efectuar uma clara distinção entre um modelo de comércio (tradicional e/ou de pequena escala) e o outro (grandes superficies e grande retalho).
De entre esses vários aspectos aquele que merece desde logo especial destaque prende-se com o factor económico, sobretudo pela forma leviana e até falaciosa como ele é geralmente abordado.
É rara a “notícia” (como quem diz … chamar notícia a textos que de rigor e reflexão jornalística pouco ou nada têm …) que não destaca o número de postos de trabalho gerados e o investimento efectuado pelo grupo económico promotor do empreendimento em causa (seja ele “shopping”, “hiper”, “super de cadeia”, etc.).
Ora bem, sendo que a criação desses postos de trabalho é um facto, a questão que urge colocar é: Foi/é em alguma dessas circunstâncias efectuado qualquer espécie de estudo que permita avaliar o impacto da abertura e concorrência directa desse investimento de “grande superfície/retalho” ao nível do encerramento de Lojas de Comércio Familiar e de Pequena/Média Escala - CFPME? Nomeadamente número de postos de trabalho perdidos (irremediavelmente)?
Seria muito interessante se algum estudo desse género fosse realizado e pudesse ser contabilizado e efectuado um balanço entre postos de trabalho criados Vs postos de trabalho “eliminados”.
Não me restam muitas dúvidas que em inúmeras situações, já para não dizer na quase totalidade, iria-se chegar facilmente à conclusão que a “miragem” dos postos de trabalho criados não passa disso mesmo e que, bem pelo contrário, o grande comércio acaba por ter um impacto muito negativo ao nível do “emprego”. Contribuindo pois para o agravamento do desemprego, como temos vindo a assistir desde que o comércio de grande escala se tem vindo a disseminar e a apropriar do espaço económico (ao que acrescentaria também cultural) outrora pertença do comércio de pequena e média escala. Até porque a lógica do grande comércio é a de “automatizar” ao máximo o próprio processo de consumo … sendo concebido para funcionar com o menor número possível, e por vezes até impossível, de trabalhadores.
Isto só falando do aspecto “quantitativo”, porque a nível “qualitativo” os postos de trabalho criados tendem a ser muito mais precários e instáveis.
Ao nível da produção e capacidade (quantitativa e qualitativa) de escoamento por parte do produtor (sobretudo se estivermos a falar de pequenos e médios produtores) também se colocam questões bastante importantes … a realidade é que com o “afunilamento” dos canais de distribuição (que se concentram cada vez mais “nas mãos” de cada vez menos “retalhistas”, e cada vez mais nas mãos de grandes corporações do retalho: em Portugal por exemplo a Sonae distribuição e a Jerónimo de Martins - dois gigantes do retalho que controlam, em conjunto, cerca de 60% do mercado nacional), as escolhas dos produtores, sobretudo pequenos produtores, tornam-se cada vez mais reduzidas, já para não dizer inexistentes.
Não é pois de estranhar que ao estarmo-nos a referir ao fenómeno da cada vez maior concentração em termos de centros e mecanismos de distribuição implique referirmo-nos a esse outro (ou no essencial não será o mesmo?) fenómeno concomitante que é o da cada vez maior concentração de entidades produtoras, e o sector alimentar é disso um excelente exemplo (apesar de em muitas situações existirem dezenas de marcas diferentes muitas vezes, e numa observação mais atenta, chegamos facilmente à conclusão que muitas dessas marcas apesar de diferentes entre si são propriedade de um conjunto muito restrito de grandes grupos económicos). Por exemplo, do nosso cabaz “habitual” de produtos alimentares quantas dessas marcas não são propriedade da “Nestlé”, da “Unilever”, etc?.
Quando nos referimos ao comércio de grande escala é importante reflectirmos também sobre a lógica e os modelos de consumo implícitos.
O modelo que geralmente é “instituído” é, por inerência e definição, um estilo de consumo mais massificado e que acaba por ser mais próximo daquilo que se pode designar por consumismo do que propriamente consumo no seu sentido mais tradicional.
Toda a dinâmica e estratégia dos grandes espaços comerciais centra-se pois numa permanente instigação ao consumo. Vezes sem conta acabamos por adquirir não somente os produtos que com alguma objectividade necessitávamos mas também, por via de algum “aliciamento” e incentivo ao consumo, muitos produtos que no fundo não tinhamos verdadeira necessidade.
Esse género de realidade acaba, ou acabava, por ser bastante mais raro nos estabelecimentos de comércio de pequena escala. Geralmente quando íamos a alguma mercearia acabava-mos por trazer somente aquilo que realmente pretendiamos inicialmente adquirir.
Por aqui pode-se facilmente deduzir que a escala de “desperdício” gerada (ou seja, produtos que acabam por não ser adquiridos e se tornam, por exemplo por uma questão de prazos de segurança/validade, inviáveis para a comercialização,) é enorme.
O desperdício (quando analisado na sua essência é uma “anormalidade” num processo natural de produção – consumo, pelo menos nas proporções dantescas em que ocorre actualmente) que, face á nossa realidade actual, acaba por nos parecer “normal” tem na verdade múltiplas implicações e nuances: não nos podemos esquecer que toda a produção implica um consumo, muitas vezes extremamente elevado, de recursos naturais, de matérias-primas. Todo o processo tem um elevado impacto em termos de consumo energético. Todo o processo, ainda para mais numa economia exacerbadamente globalizada, tem um elevado impacto na forma como se organizam as relações de trabalho (ou será exploração?) a nível global. Todo o processo tem um impacto extremamente elevado ao nível dos resíduos gerados (e na maior parte dos casos lançados na Natureza sem tratamento adequado), ou não estivéssemos a referirmo-nos ao conceito, precisamente, de desperdício …
Nessa óptica o desperdício que acaba por ser uma consequência tida quase como secundária ou lateral no processo de produção-consumo capitalista é na verdade uma concepção que se poderá considerar, face àquilo que foi exposto anteriormente, profundamente errada e até imoral …
Obviamente que chegados a este ponto somos obrigados a discutir se o próprio modelo económico vigente, baseado numa concepção orientada para um crescimento económico constante, fará de facto sentido ou se, pelo contrário, não fará cada vez mais sentido pensarmos num modelo de “decrescimento” da economia em contraponto a este modelo exacerbadamente globalizado. No fundo estaremos a falar de uma relocalização da economia num modelo essencialmente baseado nos recursos e dinamismos locais.
Falando em economia globalizada, e voltando um pouco mais especificamente à questão dos estabelecimentos de comércio, é importante para esta análise referirmos também uma outra realidade que são os “estabelecimentos especializados na importação de produtos massificados a preço baixo”. No fundo aquilo que comunmente é conhecido como as “lojas chinesas”, apesar de muitas vezes nos estarmos a referir a estabelecimentos de propietários originários do Bangladesh, da Índia, etc.
Uma das “maravilhas” da globalização do comércio (postulada, entre outras, por mega organizações sem qualquer controlo democrático como a OMC – Organização Mundial de Comércio, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional) foi/é a eliminação de muitas das barreiras alfandegárias que tinham ainda a capacidade de proteger o comércio de base nacional, local, etc. Muito basicamente diria que é um dos fenómenos mais fundamentais na compreensão da forma como se estrutura a economia e as sociedades actuais mas, não obstante, também um dos menos estudados e debatidos. É um fenómeno crucial para compreender questões tão fundamentais como as elevadas taxas de desemprego dos países ditos desenvolvidos, como a designada “crise económica”, entre muitas outras (por exemplo, a crise ambiental).
Nessa medida os nossos “mercados” são inundados com produtos provenientes “do outro lado do mundo” que nos chegam a preços, regra geral, bastante inferiores mas com um custo ambiental, laboral, social e até económico extremamente elevado e pesado; apesar de estarmos a falar de “custos” que raramente são expressos no custo final dos bens que adquirimos.
Ao nível do comércio local o surgimento deste tipo de estabelecimentos, na verdade “como cogumelos”, tem tido também, a par dos estabelecimentos de grande escala (cadeias de desconto, supers, hipers, “shoppings”, out-lets e afins), um impacto brutal e fatal no desaparecimento do “Comércio Familiar e de Pequena/Média Escala”.
Existe também uma dimensão que importa, e bastante, referir que se prende com a dimensão cultural. Se quisermos etnográfica também:
Muito mais do que simples “lojas”, os estabelecimentos de “Comércio Familiar e de Pequena/Média Escala” possuem um papel muito importante ao nível da construção e preservação da identidade cultural das comunidades locais. Naquilo que actualmente se designa como um “património imaterial” mas não só … existe também um património muitas vezes material, como o arquitectónico por exemplo, que se tem vindo a perder a um ritmo vertiginoso.
O seu desaparecimento é, simultaneamente, uma das principais causas e consequências do processo de desertificação e degradação que tem vindo a suceder nas últimas décadas nos Centros Históricos dos principais centros urbanos. O Porto é disso um exemplo “assustador”. Muitas vezes estamos a falar de ruas, por vezes quarteirões inteiros, que parecem um verdadeiro cenário de pós-guerra: casas, lojas completamente abandonadas e num avançado estado de degradação.
Assim sendo é-me extremamente difícil compreender como é tão poucas vezes estabelecido esse nexo causal, que na essência me parece evidente, entre a decadência do “Comércio Familiar e de Pequena/Média Escala” e tantos dos fenómenos anteriormente referenciados. Na verdade, muitas das propostas muitas vezes avançadas e implementadas por exemplo de chamada “requalificação urbana”, apesar de “travestidas” de comércio de pequena escala (por exemplo considerando a dimensão das lojas), são, no essencial, dinâmicas de difusão do comércio de grande escala (dado que muitas vezes consistem em estabelecimentos de grandes marcas, de cadeias multinacionais).
Parece-me pois, de forma inequívoca, que a revitalização do comércio de pequena e média escala, do comércio tradicional e/ou familiar, é de importância fundamental para a própria revitalização dos centros urbanos (mesmo os de pequena dimensão) e provavelmente vice-versa.
Parece-me ainda que uma relocalização da economia, a reconstrução de economias de carácter essencialmente local/regional, será fundamental para sairmos da situação de evidente colapso económico e laboral gerado pelo economia especulativa global. E, mais uma vez, o comércio dito de pequena e média escala, de comércio tradicional e/ou familiar, revela-se crucial.
Chegados a este ponto da reflexão é importante referir que a questão não é evidentemente linear, ou seja, a questão não reside no facto de estarmos perante “bons” e “maus” … o pequeno comércio de um lado e o grande retalho do outro, por exemplo. Não está também em causa uma completa rejeição e aversão aos novos modelos de comércio e consumo (grande retalho, cadeias multinacionais, etc.) Acima de tudo, o que está aqui em causa é o desequilibrio cada vez maior entre um modelo e outro. Tem-se assistido a uma lógica completamente “predatória” de quase completa substituição (num período de tempo relativamente curto) de um modelo pelo outro, ao ponto de, actualmente, muitos de nós, e sobretudo as gerações mais jovens, só terem quase como referência os modelos de comércio mais “modernos” e de maior escala. E são mais do que referência: são modelos quase exclusivos de consumo.
Existem muitas dinâmicas sociológicas, e elementos identitários locais, cujo desaparecimento do comércio tradicional leva também a uma, muitas vezes irreversível, extinção.
No fundo é toda a lógica de consumo, toda a lógica relacional, que é também muito diferente da lógica do grande retalho, que acaba por ser muito mais automático, “impessoal” e em vários aspectos … desumanizado.
Há pois toda uma dimensão (ou várias dimensões) afectiva e cultural que se perde … resultando numa perda talvez até bem superior às próprias perdas em termos económicos (com a deslocação dos recursos económicos da economia local para os grandes centros financeiros globais, geralmente propriedade de um conjunto muito restrito de entidades e indivíduos), não obstante a importância que estas têm para a compreensão da crise económica global actual.
Chegados a este ponto as principais questões que se colocam são:
De quem é a principal responsabilidade por tudo isto e o que pode ou não ser feito para que as coisas sejam diferentes?
O consumo possui hoje, portanto, um significado prático e sociológico profundo em todo um contexto de neoliberalismo hegemónico à escala mundial: muito para além da sua função "pré-histórica" de satisfação de necessidades essenciais, actualmente as supostas necessidades dos indivíduos – necessidades, desde logo, de forma frequente artificialmente criadas e ampliadas até à exaustão pela poderosa indústria publicitária e departamentos de marketing das principais corporações multinacionais – são o pretexto ideal para reproduzir e disseminar o consumo enquanto instituição teológica (na medida em que funciona quase como se de uma religião se tratasse), dogma cultural e mecanismo prático de alienação colectiva, mas por via de um crescente processo de feroz competição e estratificação individual materialista.
Ou ainda, segundo
Baudrillard: O consumo surge como conduta activa e colectiva, como coacção e moral, como instituição. Compõe todo um sistema de valores, com tudo o que este termo implica enquanto função de integração do grupo e de controlo social.” [3]
E isto equivale a dizer que todo este processo, e as próprias dinâmicas de comércio e consumo instituídas, não surgem “do nada” ou “por mero acaso”. Inscrevem-se evidentemente num quadro mais amplo de disseminação de um modelo ideológico neoliberal à escala global. E, face à dimensão e poder dos mecanismos de reprodução desse sistema que se tem vindo a tornar hegemónico, podemos facilmente ficar com a sensação de que não há muito que possa ser feito …
No entanto importa referir que “a responsabilidade” é também dos próprios comerciantes. É evidente que a pressão e impacto de todo o contexto económico e cultural é extremamente elevado, é evidente que é quase impossível competir com o grande comércio face a todos os instrumentos e mecanismos que este dispõem … Mas coloca-se a questão: O que é que já foi feito, ou é feito, pelos próprios comerciantes no sentido de afirmarem as suas próprias mais-valias ou comunicarem os seus próprios pontos fortes e pontos diferenciadores? Diria que pouco … Há algumas excepções, vários exemplos de sucesso de estabelecimentos de pequeno comércio que têm sido capazes de se afirmar, e até com elevado sucesso nalguns casos, num contexto de acentuada regressão do sector. Mas a verdade é que não tenho conhecimento de muitos casos que evidenciem uma significativa capacidade de cooperação, acção e visão entre diferentes unidades de pequeno comércio, apesar de muitas vezes se localizarem, por exemplo, em áreas geográficas bastante próximas.
De certa forma esse facto compreende-se pelo envelhecimento e pela ausência de perspectivas futuras que caracteriza em larga medida o sector. Não justificando isso por si só tudo.
Isto sem prejuízo de haver também diversas situações de comerciantes tradicionais que simplesmente estarão na profissão “errada”, considerando a atitude muitas vezes pouco amistosa, prepotente e em jeito de “estar a fazer um favor ao cliente ao servi-lo” que adoptam.
No entanto o potencial, o valor das suas especificidades e características diferenciadoras, está todo lá …simplesmente não tem sido devidamente reconhecido, potenciado e, sobretudo, comunicado.
E chegamos pois à responsabilidade que têm as diversas entidades competentes, ou será tantas e tantas vezes incompetentes?
A verdade é que quando falamos em “reconhecimento”, ou na ausência de reconhecimento pelo valor e valores do Comércio Familiar e de Pequena/Média Escala Comércio Familiar – CFPME, essa ausência parte, vezes sem conta, das próprias entidades que mais deveriam fazer por ele. Na verdade são as primeiras a apoiar projectos de grande escala que frequentemente constituem a “pedra lapidar” do que ainda subsiste de comércio de raíz tradicional.
A responsabilidade também é, e bastante, de cada um de nós. As nossas escolhas enquanto cidadãos, enquanto consumidores, são determinantes no sentido de definir se o nosso dinheiro irá ser investido, por princípio, na economia local, ao apoiarmos pequenas unidades de comércio tradicional e/ou familiar ou se, pelo contrário, estaremos a contribuir ainda mais para o poder económico de uma grande corporação multinacional e a contribuir ainda mais para a economia capitalista global.
Por isso diria que o factor essencial de toda esta “questão”, ou questões, é precisamente esse enorme potencial que existe de podermos fazer a diferença e podermos inverter rumos que nos parecem irreversíveis e fatais.
Há na verdade também vários óptimos exemplos de novos projectos, expressando novas tendências, que têm vindo a surgir. Existem alguns exemplos interessantes de cooperativas de consumo, cujos propósitos vão justamente no sentido de aumentar o grau de controlo e de responsabilidade do próprio consumidor no processo de consumo. Algo que contraria a tendência que tem sido fomentada pelas grandes corporações de tornarem o consumidor num ser cada vez mais permeável aos ataques de comunicação corporativa (publicitária, promocional, etc.) e, por outro lado, num ser com cada vez menos importância nas decisões em termos de funcionamento dos mecanismos de produção-distribuição-consumo. Qual é a percentagem de pessoas que se preocupa verdadeiramente com as condições em que foram fabricadas as calças que vestem? Qual é a percentagem de pessoas realmente dispostas a abdicar de comprar vestuário, só a título de exemplo, da sua marca favorita pelas condições em que esta produz (ou manda produzir) as suas roupas? Será provavelmente uma percentagem muito reduzida, particularmente num país como Portugal onde ainda vivemos inebriados pelas maravilhas que a recentemente (sobretudo nas últimas 3 décadas) sociedade de consumo nos “promete”. Mas, apesar de reduzida, é precisamente nessa minoria - talvez mais consciente, talvez mais empenhada na descoberta e criação de modelos de consumo alternativos - que reside em grande medida a esperança e possibilidade de os processos de consumo poderem caminhar num sentido de maior justiça social, maior responsabilidade ambiental, maior sedimentação de estruturas e modelos numa economia de base local. A agricultura de base local e comunitária é um óptimo exemplo. Os diversos projectos que têm surgido de hortas comunitárias, nomeadamente em contexto urbano, são importantes numa dimensão tão valiosa como é a da auto-produção. São igualmente importantes as várias feiras e mercados" alternativos que permitem um contacto mais directo e humanizado entre produtores (por exemplo artesãos) e consumidores também.
Poderá parecer que há muito pouco que possamos fazer mas, na verdade, isso é precisamente, vezes sem conta, o pretexto para não fazermos nada. E tudo aquilo que possamos fazer que seja mais do que nada é por si … muito mais do que nada.
A reflexão já vai longa … muito já foi dito mas muito mais ficou por dizer. Sobretudo, muito mais há a fazer por cada um de nós para que os nossos modelos de consumo (e claro, produção e distribuição) possam ir mais de encontro àquilo que no fundo sabemos que é mais correcto: uma maior justiça económica, social e ambiental.
E uma caminhada de mil passos começa … com o primeiro passo. (5)
Vamos a isso?

Pedro Jorge Pereira
Formador e Activista Eco-Social
Dinamizador do C.3C´s – Centro para o Consumo Crítico e Consciente e das O.3C´s – Oficinas para o Consumo Crítico e Consciente, no Porto, bem como do Projecto Terramote351 – Desenvolvimento, Formação e Turismo Eco-Social.

Correcção Ortográfica:
Sofia Barradas

C.3C´s – Centro para o Consumo Crítico e Consciente

Grupos Informativos/Discussão


Terramote351 - Desenvolvimento, Formação e Turismo Eco-social
facebook II: https://www.facebook.com/Terramote351



Pedro Jorge Pereira
telf. 93 4476236


(1) Lima, Ana Paula; (2010). Mais de 24 mil lojas fecharam as portas desde chegada dos hipermercados. Jornal de Notícias 2010 12Dez 10, [Em linha]. Disponível em <http://www.jn.pt/PaginaInicial/Economia/Interior.aspx?content_id=1731436>. [Consultado em 2012 04Abril 19].

(2) Idem

(3) Baudrillard, J. (1996). A sociedade de consumo. Lisboa, Edições 70.

(4) Lao Tsé

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Meeting Porto “Side B” for January of 2014, the Porto behind the frontage, “Oporto of Encounters” - Terramote351 for International Eco-Social Tours

 
 
Meeting Porto “Side B”, the Porto behind the frontage
Eco-Social Circuits guided by the project “Oporto of Encounters” - Terramote351 for International Eco-Social Tours for
January of 2014 

Terramote351 – Meeting Porto “Side B”, AGENDA for JANUARY

Fridays 17h, 24th and 31h of January,
10.15am
Meeting point: In Front of “Dar à Sola” Association, in Rua dos Caldeireiros, nº204 (very near Clérigos Tower)
(Program: Friday, 17h of January, Circuit 1 – “Douro and its secrets” (around Ribeira, and the deep heart of the historical centre) Friday, 24h January, Circuit 2 – “A Porto older than the Sé of Porto” (around the historical district of Sé and its sorroundings) Friday, 31h of January, Circuit 3 – “B of Vitória” (around the historical district of Vitória and its sorroundings)

Important information about the trips:
Difficulty rate: accessible
Time: 2h30
Logistics: take comfortable clothing adaptable to the climate circumstances of the proper day.
Contribution: with the valuable that you feel “Fair” in the end of the circuit
Registrations: maximum of 15 participants (it will be an activity with a reduced number of participants) and the places will be taken when the registrations are done with confirmation.

How to apply:
Book your tour in Dar à Sola, in Casa da Horta, or send your personal information to:


  • More information


Oporto of Encounters – Terramote351 for International Eco-Social Tours
Linkedin: http://www.linkedin.com/profile/view?id=289111419

Organization: Terramote351
Note: the Terramote351/Oporto of Encounters project, is a project with a really informal and personal nature, and it is still defining itself, so it’s an activity that it is not covered by any type of insurance, the participants are responsible for anything that happens, or, depending on the perspective, the destiny is… ;O) The contribution is destined to support the various organization costs and to support the Terramote351 - Intervention and Eco-Social Tours project development.

Terramote351 - Intervention and Eco-Social Tours

Facebook


Partnership and support:

NGO´s and Cool Spots in Porto:

Casa da Horta – Associação Cultural – Web: http://www.casadahorta.pegada.net/ facebook:

Dar à Sola - Associação Cultural e Recreativa de Artes e Oficios – Web: http://darasola-associacao.blogspot.pt facebook: https://www.facebook.com/like.darAsola


Accomodation and Alternative Tourism:

B.Places: Urban Regenaration Project – Web: http://marcoferreir8.wix.com/bplaces facebook: facebook: https://www.facebook.com/b.places.apartments

Portugal Green Stays – Web: www.greenstays.pt facebook: https://www.facebook.com/GreenStays

Rotas Solidárias / Solidarity Routes (InComunidade) – Web: www.rotassolidarias.org facebook: https://www.facebook.com/RotasSolidariasSolidarityRoutes

 

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

“Porto de Encontros - Circuíto Ecologia e História" – Da Lapa a Cedofeita, Dia 11 de Janeiro de 2013, Sábado, às 15h15


Porto de Encontros - Circuíto Ecologia e História" – Da Lapa a Cedofeita
Circuito Eco-Social dinamizado pelo Espaço Marabô e ProjectoTerramote351
Dia 11 de Janeiro de 2013, Sábado, às 15h15
(duração aproximada: 2h30)

 
Porto de Encontros - Circuíto Ecologia e História"
O propósito principal de ““Porto de Encontros - Circuíto Ecologia e História"” é o de efectuarmos um Percurso de descoberta temático e/ou por uma zona específica do Porto para descobrirmos ou (re)descobrirmos os mil e um segredos e realidades geralmente despercebidas da nossa cidade e comunidade. Assim como reflectirmos, de forma crítica e consciente, de forma positiva e em “jeito de partilha”, sobre os inúmeros aspectos sociais, ecológicos e culturais suscitados - literalmente - a cada passo.

Porto de Encontros - Circuíto Ecologia e História" – Da Lapa a Cedofeita
Não sendo uma das zonas mais “turísticas” do Porto a zona da Lapa, e Cedofeita, possuem pontos e aspectos de infindável interesse histórico, cultural e eco-social.
Desde episódios históricos marcantes (Cerco do Porto, época Sueva, etc.) até locais onde ficaram e estão bem patentes elementos fundamentais para a compreensão da cidade e da sua identidade mais autêntica.

Que tal passear numa via contemporânea de D. Afonso Henriques que nos conduzia a Santiago de Compostela? E o Lugar do Olho Vivo? E a Rua da Glória, local visitado dias a fio pelo nosso Rei-Soldado, com o seu moinho telégrafo?

Onde era a antiga Secretaria do Reino? E a casa do Rei no período do Cerco?
Sabe onde se localiza o caminho das águas do manancial de Salgueiros e Arca de Água ? E a pequena Igreja que se diz ter sido desenhada por Nasoni?
E uma criação de um dos maiores arquitectos portuenses, Figueiredo Seixas? E a Igreja que guarda o coração de um Rei? E já agora, o Romantismo na forma de um cemitério?

Estas e muitas, muitas mais perguntas se irão colocar e responder neste passeio.
Se conhece o Porto, a sua companhia terá duas vantagens : o prazer que nos dá com a sua presença e a oportunidade que teremos em trocar conhecimentos e aprender ainda mais.
Se não conhece, aproveite este passeio para descobrir um pouco da história desta maravilhosa cidade.

Eco-Socio Circuito” guiado por...
Ernesto Vaz Ribeiro
Profundo conhecedor e apaixonado da história e presente da cidade e cultura do Porto, Ernesto Martins Vaz Ribeiro é Gestor em áreas da Qualidade e da Melhoria Contínua num Grupo Francês do sector automóvel, onde executa ainda Formação. O seu gosto pela História vem da juventude, tendo ligado a si o prazer da descoberta e da associação dos pormenores que conduzem à compreensão do meio que nos rodeia e das Organizações onde nos inserimos. Sobre História, trabalho que desenvolve a par com a Indústria, publicou em 2010 o livro “Porto de encontro de História, Arte e Religião – A Penaventosa”, estando já finalizado e saindo brevemente um segundo intitulado “Porto de encontro de História, Arte e Religião – O Monte do Olival”.

Pedro Jorge Pereira
Pedro Jorge Pereira é Formador e Activista Eco-Social. Tem vindo a desenvolver um trabalho sistemático de estudo, observação e intervenção, através de diversos projectos, na cidade do Porto. Tem vindo a estar ligado a diversos Movimentos de indole cívico, sobretudo ambiental, e social. Para além do aspecto lúdico e cultural uma das vertentes primordiais presentes nos Circuitos Eco-Sociais é a da sensibilização e valorização do nosso Património Histórico (de índole material mas também imaterial).


Porto de Encontros - Circuíto Ecologia e História" – Da Lapa a Cedofeita

Dia 11 de Janeiro de 2013, Sábado, às 15h15
Ponto de Encontro: Escadarias da Igreja da Lapa
Grau de dificuldade: Acessível
Duração do percurso: Aproximadamente 2h30
Logística: Levar roupa confortável e adaptada às circunstâncias climatéricas do próprio dia.
Contribuição: 8 Portos ou 6 Portos para mais do que uma inscrição.
Data Limite de Inscrição: Até 9 de Novembro de 2014, 5ªfeira

Modo de Inscrição:
Marabô
910 785 717 (Após inscrição, ser-lhe-à fornecido o trajecto deste circuito)


Organização: Marabô e Projecto Terramote351

Espaço Marabô
Situada na cidade do Porto, a Marabô – Formações & Eventos Culturais surge para dar a conhecer às pessoas, de um modo simples e inovador, aquilo que as rodeia.
Reinventando o conceito de formação e com uma “mãozinha” da Psicologia, na Marabô terá a oportunidade de se encontrar consigo mesmo e de entender melhor os passos que deu para chegar onde está.
Não esquecendo a História, será possível participar em caminhadas e conferências sobre diferentes temas, sendo um deles a histórica e “esquecida” cidade do Porto – será possível vê-la como nunca a viu? Venha connosco e surpreenda-se!
Mais e mais novidades surgirão, mas sempre com o mesmo comprometimento: proteger aquilo que mais parece ter caído no esquecimento – o Homem e as suas criações.

Terramote351 – Desenvolvimento, Formação e Turismo Eco-social
Terramote351 é um projecto pioneiro, oriundo do Porto, e começou a dar os seus primeiros passos como Porto de Encontros – Visitas Eco-Sociais.
Nesta sua vertente dinamiza actividades para o desenvolvimento dos princípios e valores do Turismo Eco-Social:


Funciona através da dinamização e apoio a actividades e projectos de intervenção, sempre através da componente de sensibilização/formação para a(s) realidade(s) local/locais e através da realização de Circuitos Eco-Sociais com relevância histórica, cultural e, predominantemente, Eco-Social.

Terramote351 – Circuítos Eco-Sociais
Os CES - Circuitos Eco-Sociais possuem um carácter histórico, nomeadamente com o intuito de valorização do património local (sinalizando, por exemplo, situações de degradação) mas sobretudo uma vertente “crítica” em termos sociais, culturais e ecológicos. Uma vertente crítica no sentido de “convidar” todas as pessoas, partindo naturalmente das comunidades locais, a pensar e sonhar uma cidade e sociedade melhor para tod@s.

Mais informações:
Marabô
910 785 717

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Terramote351 - Desenvolvimento, Formação e Turismo Eco-social
93 447 6236 (Pedro Jorge Pereira)

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https://www.facebook.com/Terramote351

Oporto of Encounters – Terramote351 for International Eco-Social Circuits